quarta-feira, 22 de outubro de 2008

FORMAÇÃO E FRAGMENTAÇÃO DA IUGOSLÁVIA

Em 1918, no final da primeira guerra mundial, a dissolução da monarquia dual austro-húngara deu origem a diversos estados nacionais, dentre eles o Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos. Os tratados de Neuilly-sur-Seine, Saint Germaine-em-Laye, Trianon e Rapallo fixaram as fronteiras do país que seria transformado em Reino da Iugoslávia em 1929, com um sistema político autoritário comandado por Alexandre I.

Invadido e dominado em 1941 pela Alemanha, com o auxílio dos Ustaše (organização nacionalista croata de extrema direita), o reino virou palco de diversos conflitos internos que, segundo estimativas, mataram mais de um milhão de pessoas.

Os Ustaše eram favoráveis à invasão alemã pois tinham em sua base ideológica o objetivo de formar uma croácia etnicamente pura e foram postos no comando do Estado Independente da Croácia forjado pelos países do eixo após eles dominarem o Reino da Iugoslávia. O Conselho Antifascista de Libertação Nacional, grupo de orientação comunista, liderado por Josip Broz Tito, expulsou os alemães em 1944 e liquidou o Estado croata comandado pelos Ustaše.

Tito ainda enfrentou outra forte oposição durante a luta contra os alemães. A dos Chetniks, nacionalistas sérvios liderados por Draza Mihailovic, que apoiavam a monarquia. No entanto o grupo de Tito saiu vitorioso e formou-se, inicialmente, a Iugoslávia Democrática Federal. Seu nome foi alterado em 1946 para República Federativa Popular da Iugoslávia e em 1963 para República Socialista Federativa da Iugoslávia.

Tito lutou na primeira guerra pela infantaria do império austro-húngaro e foi feito prisioneiro na Rússia, onde entrou em contato com idéias comunistas. Fugiu da prisão, lutou pela revolução russa e retounou ao Reino da Iugoslávia, onde envolveu-se com o partido comunista e ficou preso por seis anos.

Em novembro de 1945, Tito assumiu o cargo de primeiro-ministro da Iugoslávia ocupando-o até janeiro de 1953 quando tornou-se presidente do país. Organizada sob a forma de uma federação, a Iugoslávia era formada por seis repúblicas e duas províncias autônomas pertencentes à república da Sérvia. Veja o mapa e a legenda:
1. Repúlica Socialista da Bósnia e Herzegovina
2. República Socialista da Croácia
3. República Socialista da Macedônia
4. República Socialista da Montenegro
5. República Socialista de Sérvia
5a. Província Socialista Autônoma do Kosovo
5b. Província Socialista Autônoma da Voivodina
6. República Socialista da Eslovênia

Trata-se de um barril de pólvora. De forma brilhante, o jornalista Norman Stone, da revista Newsweek, resumiu a situação da Iugoslávia de Tito na seguinte frase:

"A Iugoslávia tinha seis repúblicas, cinco povos, quatro linguas, três religiões, dois alfabetos e um partido - comunista."

As seis repúblicas correspondem às expostas no mapa acima. Os cinco povos correspondem aos sérvios, montenegrinos, croatas, eslovenos e macedônios. Não há um povo bósnio em termos de origem étnica. A república da Bósnia era habitada por sérvios, croatas e muçulmanos. As quatro línguas da Iugoslávia eram o servo-croata, o esloveno, o macedônio e o albanês (falado no Kosovo). As três religiões correspondem ao catolicismo romano, o catolicismo ortodoxo e o islamismo. O sérvios escrevem o servo-croata com o alfabeto cirílico enquanto os croatas usam os carcteres latinos.

Para sustentar a unidade nesse barril de pólvora, repleto de nacionalismos, Tito usou forte repressão policial contra os movimentos de contestação, e de um sistema político de autogestão que conferia grandes liberdades de decisão sobre as formas de produção aos trabalhadores. Uma inspiração anárquica que afastou o país de influências diretas da União Soviética.

Aliás, Tito, juntamente com Nasser (Egito) e Nehru (Índia), foi um dos maiores líderes e o primeiro secretário geral de um grupo de países que ficou conhecido como movimento dos não-alinhados, tendo organizado em Belgrado a primeira reunião de cúpula, em 1961. Buscava-se reduzir a vulnerabilidade em relação às superpotências da guerra fria. Existente até hoje, o grupo já foi comandado por diversos chefes de Estado como Nasser, Castro, Mandela, Mugabe e, atualmente, é comandado por Raul Castro. O último encontro de cúpula ocorreu em 2006, em Cuba.

Com carisma, habilidade política e repressão, Tito conseguiu conter os ímpetos nacionalistas durante o seu governo. Após sua morte, em 4 de maio de 1980, a presidência do país passou a ser colegiada, com rodízio na ocupação do cargo. No entanto, iniciou-se o complexo processo de desmembramento das repúblicas que compunham a Iugoslávia em função das tensões crescentes dentro do território.

Em 1991, Croácia, Eslovênia e Macedônia declaram independência. Sérvia e Montenegro uniram-se para formar uma nova Iugoslávia com o nome oficial de República Federal da Iugoslávia. Em 1992 seria a vez da Bósnia declarar sua independência. Então iniciam-se os conflitos armados.

Os sérvios presentes na Croácia e na Bósnia reivindicaram a incorporação do território por eles ocupado à nova Iugoslávia. Na Croácia, chegaram a fundar a República Sérvia da Krajina, que desapareceu em 1995. Na Bósnia, os sérvios opuseram-se aos croatas e muçulmanos em uma guerra civil sangrenta marcada pela prática de limpeza étinica dos dois lados. Os sérvios (católicos) matavam muçulmanos na Bósnia enquanto os croatas matavam minorias sérvias na Croácia.

Eslovênia e Macedônia, com pequenas minorias sérvias, não vivenciaram conflitos importantes no processo de separação. A situação da Bósnia foi resolvida com o Acordo de Dayton (1995) que transformou o país em uma confederação formada por uma república muçulmano-croata e uma república sérvia, separando territorialmente esses grupos.

Em maio 2006, os montenegrinos foram às urnas e 55,5% deles optaram, em um plebiscito, pela separação em relação à Sérvia. Com essa separação ficou concluído o processo de fragmentação das seis repúblicas que formaram a antiga Iugoslávia. No entanto ainda não está concluída a separação das províncias autônomas da Sérvia.

Na Vojvodina, a minoria de origem húngara exerce pressões contra o governo da Sérvia pela independência, no entanto a escala dessa reivindicação nacionalista pouco se aproxima da situação que se desenrolou no Kosovo.

Sendo a maioria da população do Kosovo de origem albanesa, a formação de uma Grande Albânia inspirou o movimento separatista na região. Em 1989, quando os kosovares celebravam os 600 anos da batalha do Kosovo, o então presidente da Iugoslávia, Slobodan Milošević, retirou a autonomia política da província, proibindo o ensino do albanês nas escolas, entre outras limitações.

Em 1991, os kosovares declaram uma independência que não foi reconhecida nem pelas Nações Unidas, portanto a Sérvia manteve suas tropas na região. Em 1996, o Exército de Libertação do Kosovo iniciou uma luta armada em oposição ao poder de Milošević e a Sérvia respondeu com massacres e deportações. Em 1998, a ONU proibiu a venda de armas para a Iugoslávia em função dos altíssimos níveis de violência atingidos no conflito.

Em 1999, a OTAN bombardeou a Sérvia, encerrando o conflito que já durava praticamente três anos. No início daquele ano entrava em vigor o Euro, moeda comunitária da União Européia. Uma moeda recente e frágil diante de instabilidades políticas. A Grécia e a Itália, países próximos ao Kosovo, adotaram a nova moeda. Essa proximidade do conflito com a zona do Euro motivou ainda mais a ação da OTAN, que tem diversos países europeus em seu quadro de membros.

Em fevereiro de 2008, os kosovares declararam sua independência, que não foi reconhecida pela Sérvia nem pela Rússia, principal aliada dos sérvios, mas foi reconhecida imediatamente pelos Estados Unidos e outros países. A declaração de independência coloca o novo país sob a supervisão internacional, proíbe-o de juntar-se com outro país e garante a proteção para as minorias étnicas. O processo ainda não possui o reconhecimento das Nações Unidas.
[Clique no mapa para ver as mudanças territorias em detalhes]

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

O HORÁRIO DE VERÃO

Polêmico e controverso, o horário de verão tem sido implantado regularmente pelo governo brasileiro nos últimos anos dividindo opiniões na sociedade, pois há aqueles que são favoráveis e aqueles que são contrários à mudança de horário que começa, em geral, no mês de outubro e termina em fevereiro do ano seguinte.

O horário não é implantado em todo o país. Apenas dez estados e o Distrito Federal alteram os ponteiros de seus relógios adiantando-os em uma hora. Os dez estados são: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná (Região Sul); São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo (Região Sudeste) e Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (Região Centro-Oeste).

Os estados das regiões Norte e Nordeste não adotam o horário de verão pois neles não há mudança significativa no tempo de iluminação solar durante os dias dessa estação. Já nos estados mais distantes da linha do equador esse tempo de iluminação varia significativamente, com o Sol nascendo mais cedo e pondo-se mais tarde. Essa diferença no tempo de iluminação é provocada pela inclinação do eixo da terra associada aos movimentos de translação e rotação. Observe o esquema:


Note que em função da inclinação do eixo da terra o hemisfério sul está mais voltado para a direção de origem dos raios solares do que o hemisfério norte. Isso gera um tempo maior de exposição aos raios solares no hemisfério sul fazendo o sol nascer mais cedo e pôr-se mais tarde.

Perceba também que o pólo sul é iluminado quase constantemente e que, portanto, quanto mais distante da linha do equador maior é a diferença no tempo de iluminação. É por isso que os estados brasileiros mais próximos ao paralelo 0º não percebem variações significativas no tempo de iluminação e não adotam o horário de verão.

O Brasil é o único país equatorial que adota o horário de verão. No entanto isso só ocorre em função da grande extensão latitudinal (norte-sul) do país pois nenhum estado muito próximo ou cortado pela linha do equador adota o horário especial. Observe o mapa que mostra os países que adotam, já adotaram ou nunca adotaram o horário de verão.

Como se vê, em quase todo o mundo não-equatorial o horário de verão é ou já foi adotado. Isso ocorre porque ele possibilita uma economia de energia significativa nesse período do ano pois com o adiantamento de uma hora o dia escurece mais tarde retardando o acender das luzes.

Nos últimos anos o Brasil tem economizado de 5% a 6% de energia no período do horário especial. Parece pouco. No entanto trata-se de uma economia que se manifesta nas regiões de maior concentração populacional (Sudeste, Sul e Centro-Oeste) com mais de 120 milhões de habitantes, o que aumenta a importância dessa economia.

Porém, a mudança de horário altera o modo de vida da população que, primeiramente, precisa se adaptar ao novo horário. Uns conseguem uma adaptação mais rápida mas para outros o processo é lento. Há quem saia muito cedo de casa e a escuridão provocada no início do dia incomoda. Mas há quem goste da sensação de chegar em casa com o céu claro ou aproveitar a praia e o pôr do sol até mais tarde. Há várias outras razões para gostar ou não da mudança.

E você, leitor? Gosta ou não do horário de verão?

Abraços!


P.S.: Em 2011, o estado da Bahia também adotou o horário de verão.

sábado, 11 de outubro de 2008

O CONCEITO DE LUGAR

O conceito de lugar ganhou nova dimensão, que foge ao senso comum, quando visualizado pelas mais recentes correntes do pensamento geográfico: a geografia humanística e a geografia marxista, que viabilizaram um redimensionamento não só do conceito de lugar bem como de diversos outros conceitos fundamentais da geografia.

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Em sua nova visão, o lugar ganha em abrangência de significado deixando de ser compreendido apenas como um espaço produzido, ao longo de um determinado tempo, pela natureza e pelo homem, para ser visto como uma construção única, singular, carregada de simbolismo e que agrega idéias e sentidos produzidos por aqueles que o habitam.

Muito além de um espaço físico, de uma paisagem repleta de elementos e de referências peculiares passíveis de descrições objetivas e racionalizadas, o lugar, na visão humanística, constitui-se como uma paisagem cultural, campo da materialização das experiências vividas que ligam o homem ao mundo e às pessoas, e que despertam os sentimentos de identidade e de pertencimento no indivíduo. É, portanto, fruto da construção de um elo afetivo entre o sujeito e o ambiente em que vive.


Inicialmente, o lugar foi definido por Aristóteles como o espaço que circunda o corpo. Descartes, buscando elaborar o conceito aristotélico, afirma que a determinação do lugar deve obedecer à relação da posição do corpo com a posição dos outros corpos. A dialética marxista identifica na apropriação capitalista do espaço um processo de personalização dos lugares que, simultaneamente, reconstroem suas singularidades e expressam o fenômeno global em curso nos últimos séculos.

Apesar das singularidades dos diversos lugares, crescem, especialmente em função da expansão das redes de comunicação e de transportes que vivenciam franca aceleração no mundo contemporâneo, as interações entre os lugares, embora hierarquizadas de acordo com suas infra-estruturas logísticas conectoras.

Portanto, o conceito de lugar amplia-se profundamente diante das novas visões desenvolvidas por aqueles que se debruçaram sobre ele mediante as perspectivas marxistas e humanísticas da geografia recente. Expressando singularidade e globalidade, e materializando a construção de identidades individuais e coletivas, o lugar passa a representar muito mais do que um espaço que circunda o corpo.